Em Santarém, ação conjunta do MPPA e MPF requer cancelamento das licenças concedidas a Buriti Imóveis

A Avanco Resources aumentou a meta de produção para este ano. De acordo com comunicado divulgado nesta sexta – feira (22), a empresa espera exceder o limite da meta de produção de cobre e ouro na Mina Antas, que pode chegar a 14.150 toneladas de cobre e até 11.750 onças de ouro.

O cancelamento das licenças concedidas em 2017 à empresa Sisa Salvação (Buriti Imóveis) para construção do residencial Cidade Jardim em Santarém, e a reparação de danos, é o objeto da Ação Civil Pública ajuizada em conjunto pelo Ministério Público Estadual (MPPA) e Federal (MPF). De imediato, requer a suspensão das licenças concedidas e que a empresa cesse qualquer intervenção na área do empreendimento, inclusive com suspensão da venda de lotes, até que seja providenciada a regularização do licenciamento ambiental junto ao órgão competente (Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará- Semas).

A ACP visa também a consulta da população atingida e a reparação dos danos socioambientais pela ação da empresa, que em 2012 desmatou 186,24 hectares nas proximidades do Juá, lago do rio Tapajós. O histórico do empreendimento e os danos causados ao lago e às pessoas que dele sobrevivem estão expostos na ação, ajuizada na quinta-feira (14), na Justiça Federal de Santarém, tendo como réus a Sisa Salvação Empreendimentos Imobiliários Ltda (Buriti Imóveis), o Estado do Pará e o Município de Santarém.

A empresa pretende construir loteamento urbano às margens da rodovia Fernando Guilhon, nas proximidades do lago do Juá. O residencial Cidade Jardim I possui área de 995.417 m² (99,52 hectares), a qual será dividida em 2.751 lotes. Desses, 1.693 lotes seriam residenciais, e 1.058 comerciais. Embora a empresa tenha recebido em 2017 a licença para construir em área inferior a 100 hectares, os terrenos de sua propriedade totalizam aproximadamente 1.370,58 hectares e são derivados do imóvel chamado “Terreno Rural Salvação”, cuja cadeia dominial do imóvel está descrita na ação.

Na imagem abaixo, veja em amarelo, o perímetro total do imóvel supostamente de propriedade da empresa, correspondente a aproximadamente 1.370 hectares, bem como a área do Residencial Cidade Jardim I (99,54 hectares). Em verde, perímetro da Área de Proteção Ambiental do Juá (Lei Municipal nº. 19.206/2012); em vermelho, o traçado da Rodovia Fernando Guilhon.

A ACP requer a concessão de liminar para sustação imediata de todos os efeitos das licenças Prévia e de Instalação, expedidas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente, e do Decreto Municipal nº. 793/2017, da prefeitura de Santarém. E que a empresa pare, imediatamente, qualquer intervenção na área e suspenda a venda de lotes até que seja providenciada a regularização do licenciamento ambiental junto à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas), com apresentação e aprovação de Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA).

E ainda que o município e a Sisa adotem, de imediato, medidas emergenciais de contenção do dano ambiental verificado, de modo a evitar o agravamento do assoreamento do lago do Juá e do rio Tapajós. As medidas devem ser apontadas em perícia a ser determinada pelo Juízo em caráter de urgência, devido ao inicio do período chuvoso na região. Requer que a Secretaria Estadual de Meio Ambiente não emita qualquer licença ambiental ao empreendimento sem que antes sejam realizados: apresentação e avaliação técnica positiva de EIA-RIMA; audiências públicas com a sociedade civil; consulta livre, prévia e informada com os pescadores artesanais afetados e mitigação e contenção dos danos socioambientais já verificados.

Ao final requer a confirmação dos pedidos liminares, com a anulação das licenças e autorizações já concedidas, e que o município e a SISA providenciem a reparação integral dos danos socioambientais, de acordo com o que vier a ser apurado em perícia específica a se realizar no curso do processo. Por fim, requer indenização a ser paga pelo município e pela empresa, por danos morais coletivos decorrentes das condutas ilícitas narradas na ação.

Assinam a ação pelo MPF, os procuradores da República Luís de Camões Lima Boaventura, Luisa Astarita Sangoi e Paulo de Tarso Moreira Oliveira; pelo MPPA, os promotores de justiça Ione Missae Nakamura e Tulio Chaves Novaes, além de Rodrigo Magalhães de Oliveira, assessor do MPF, Ramon da Silva Santos, assessor da promotoria Agrária e os estagiários de Direito Thaison Brasil e Sandra Lorrany Carvalho.

Danos ao lago e aos pescadores tradicionais

“Não tem mais um lago, hoje a gente tem só um lamaçal”, afirmou um dos pescadores entrevistados na visita técnica realizada pelo MPF e MPPA no dia 7 de dezembro deste ano. O resultado está no Relatório de diligências para investigar os impactos socioambientais sobre a sub-bacia hidrográfica do lago do Juá, e aos pescadores que tradicionalmente usam o local. Com isso, o MP demonstra a necessidade de realização de consulta prévia, livre e informada aos pescadores artesanais impactados, nos termos da Convenção nº. 169 da Organização Internacional do Trabalho.

O relatório contém entrevistas com moradores e pesquisadores, registros fotográficos, análise de imagens de satélite e mapa topográfico do lago. O Juá é um lago fluvial situado a nove quilômetros do centro urbano de Santarém, em zona considerada de expansão urbana desde o ano de 2006, nas proximidades da Rodovia Fernando Guilhon. Conecta-se ao rio Tapajós através de um canal ou paraná.

Com a expansão da cidade, o Juá se tornou uma das poucas opções para os pescadores artesanais que vivem na zona urbana, em especial nos bairros do Maracanã e Mapiri. Segundo dados da Colônia de Pescadores Z-20, apenas nestes dois bairros há 240 pescadores cadastrados. O Juá também é utilizado por pescadores dos bairros do Santarenzinho, São Brás, Eixo Forte, Cucurunã e Santa Maria. As lideranças foram unânimes em apontar que o desmatamento produzido pela Buriti, em 2012, foi o principal fator desencadeador do assoreamento do Juá e, consequentemente, da mudança de seus modos de vida e da precarização de sua subsistência.

Os impactos foram confirmados na dissertação de mestrado “Avaliação espacial e temporal das taxas de sedimentação do Lago do Juá, Santarém-Pará-Brasil”, defendida por Zelva Cristina Amazonas Pena em julho de 2016, no Programa de Pós Graduação em Recursos Aquáticos Continentais Amazônicos, da Ufopa. A pesquisa e suas conclusões estão detalhados na ação, como elevação de temperatura, mudanças na característica da água e redução de pescado. “O assoreamento do Lago do Juá, portanto, é um fato inegável, empiricamente e cientificamente comprovado”, afirma o MP.

Para o MP estão demonstrados todos os elementos ensejadores da responsabilidade civil da empresa Sisa pelo assoreamento do Lago do Juá e impactos decorrentes: conduta (supressão vegetal e omissão nas medidas de contenção do assoreamento), nexo causal (erosão e carreamento de sólidos por águas pluviais) e dano (assoreamento do Juá, modificação do ecossistema e impactos sobre os pescadores artesanais).

Histórico

Em 2012, quando recebeu as primeiras licenças, a empresa suprimiu 186,7 hectares de vegetação nativa. Na época declarou que pretendia utilizar cinco dos imóveis para implantação de loteamento, totalizando 965 hectares. A área foi fracionada em lotes inferiores a 100 hectares, limite que a lei permite ao município conceder o licenciamento. “O fracionamento do licenciamento ambiental não implicou somente em driblar a competência do órgão licenciador estadual, que seria constitucional e legalmente competente para conduzir o licenciamento, mas também implicou na não obrigatoriedade de Estudo de Impacto Ambiental e de realização de audiência pública”, ressalta a ação.

Em janeiro de 2013, as licenças foram canceladas, com o envio do processo de licenciamento ambiental à Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado do Pará. Em agosto de 2017, a empresa requereu novamente à Semma de Santarém o licenciamento ambiental, desta vez referente à área inferior. Embora tenha solicitado abertura de licenciamento apenas quanto ao Residencial Cidade Jardim I, “o artifício do fracionamento persiste”, afirma o MP.

Em reuniões realizadas com a representação da empresa, foi questionado quanto à pretensão de dar continuidade aos outros quatro residenciais na mesma área. “A ré deixou claro que a expansão do licenciamento estará sujeita tão somente às condições de mercado”, admitindo que, se as condições forem favoráveis, irá expandir o loteamento. “Se antes a estratégia foi fracionar o imóvel, mas licenciá-los concomitantemente; agora, a estratégia é licenciar etapa por etapa, de acordo com a lei da procura do mercado, como se o impacto não fosse cumulativo”, aponta a ACP.

O atual relatório de controle ambiental apresentado à Semma pela empresa assegura que “na área de estudo não existe corpos d’águas”, reduzindo os impactos do empreendimento aos limites do loteamento. Afirma, porém, que o lago do Juá será o principal corpo hídrico receptor da drenagem pluvial do empreendimento. “Não há previsão de impactos sobre o Juá, nem há qualquer menção sobre assoreamento, impactos sobre os pescadores e as famílias que vivem nos arredores do lago. Tampouco o estudo faz menção sobre os gravíssimos impactos já produzidos”, adverte o MP. “Trata-se de um verdadeiro escárnio com a probidade administrativa e, acima de tudo, com a sociedade civil santarena”.

A ação ressalta ainda que diante da impossibilidade de negar os danos consumados ao Lago do Juá, a estratégia da empresa tem sido de responsabilizar a “Ocupação Vista Alegre do Juá” e o Residencial Salvação pelo assoreamento, evitando se comprometer com os custos da reparação. Ocorre que a ocupação teve início em agosto de 2014, momento posterior ao início do intenso assoreamento, o que ocorreu no inverno de 2013 (março a julho).

Com relação ao Residencial Salvação, “não há dúvidas de que este empreendimento também concorreu para o assoreamento do Lago do Juá, sobretudo antes da conclusão de seu sistema de drenagem, porém as informações preliminares levantadas indicam que a maior responsabilidade pelo assoreamento é da supressão vegetal produzida pela Buriti, o que poderá ser tecnicamente verificado em ulterior perícia judicial”, conclui o MP. Com informações do Ministério Público.

Conforme nota enviada  ao Portal Canaã a Sisa Salvação, empresa do Grupo Buriti, esclareceu que obteve as licenças ambientais exigidas para as obras do Residencial Cidade Jardim em Santarém-Pará junto a SEMMA.  Os projetos de urbanismo, terraplanagem, pavimentação asfáltica, rede de distribuição de água potável, rede de distribuição de energia elétrica com iluminação pública, rede de drenagem de águas pluviais, rede coletora de esgoto sanitário, paisagismo e cronograma de obras, foram devidamente apresentados às secretarias competentes: Secretaria Municipal de Infraestrutura (SEMINFRA), Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) e Coordenadoria Municipal de Habitação e Desenvolvimento Urbano (CHDU), todos seguindo rigorosamente a legislação em vigor para este tipo de empreendimento.

Segundo a empresa as obras só foram iniciadas após a obtenção do alvará de construção e do decreto de aprovação emitidos pela Prefeitura Municipal de Santarém-Pará. A SISA informa que prestará todos os esclarecimentos ao judiciário e que são improcedentes as suspeitas de irregularidades em suas operações no empreendimento.

 

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