Barcarena tem pior índice de saneamento básico entre municípios com mais de 100 mil

Em 2018, entre os municípios acima de 100 mil habitantes, Barcarena ficou em último lugar, com o pior índice de saneamento (94,33 de 500), segundo o ranking da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental.

Quando se consideram os municípios de pequeno e médio porte (que têm até 100 mil habitantes), Barcarena ainda fica na lanterna – o saneamento na cidade, que é responsabilidade da prefeitura, só é melhor do que em 14 municípios dos 1.894 que estão no ranking. O segundo pior índice é da cidade de Santarém, também paraense.

Barcarena tem também um dos piores índices de doenças relacionadas ao saneamento ambiental inadequado, como cólera, infecções intestinais virais, diarreia e gastroenterite. De acordo com o ranking que relaciona os grandes municípios, a taxa em Barcarena é de 216,8 internações por 100 mil habitantes. Só perde para cinco grandes – entre elas as paraenses Altamira (402,95 por 100 mil habitantes) e Belém (287,47 por 100 mil habitantes), capital do estado.

O saneamento e abastecimento de água em Barcarena é de responsabilidade da empresa privada Águas de São Francisco, que recebeu a concessão da prefeitura em 2014. O contrato dura 30 anos. A Águas de São Francisco é administrada pela Aegea, que foi criada em 2010 e detém 33% do mercado privado de saneamento básico do Brasil. A empresa tem como maiores acionistas as famílias Vettorazzo e Toledo, de São Paulo, e os demais são fundos de investimento internacionais. A Águas de São Francisco anunciou um investimento de R$ 188,6 milhões, dos quais pelo menos R$ 39,5 milhões foram investidos até junho de 2018.

A empresa possui um laboratório próprio, onde analisa pH, temperatura, ferro, turbidez, cor aparente, coliformes fecais, totais e bactérias heterotróficas. A empresa não respondeu à Pública se há análise e tratamento de metais pesados.

A Águas de São Francisco explica que no sistema Conde Praça é necessário realizar precipitação de alumínio, método usado para retirar o metal da água.

A professora Simone Pereira, que coordena o Laquanam, conhece bem esse cenário de contaminações.

Ela é engenheira química e faz pesquisas em Barcarena há 30 anos, desde quando concluiu seu trabalho de conclusão do curso para ser professora, em 1985. Começou a acompanhar as atividades das mineradoras mais de perto em 2007, quando houve vazamento de quase 300 milhões de litros de caulim, minério usado na produção de papel, cerâmica e tintas, da francesa Imerys. “Nós sempre temos problemas em relação a essas bacias: na época do inverno, são efluentes e, no verão, em relação aos particulados – que são como uma poeira em suspensão”, resume ela.

Diante desse cenário, Simone é taxativa sobre a atividade das indústrias em Barcarena: “Não fazem nenhum tratamento nesse rejeito. Do jeito que saem dos tambores, eles são levados pra cima da bacia, sobem na montanha de rejeitos e depositam lá em cima e compactam esse material. Com o passar do tempo e a desativação da bacia, vão jogar uma capa de solo que não vai impedir que a chuva continue a cair e leve esses metais no ambiente”.

O relatório produzido com base na análise do Laquanam em 2014 indica que uma fábrica de alumina pode gerar entre meia e duas toneladas de lama vermelha para cada tonelada de alumina produzida. O estudo da UFPA mostra que a lama vermelha é formada principalmente por ferrugem, alumina, dióxido de titânio e sílica.

Segundo a Semas, a lama vermelha da Alunorte, que fica abrigada nas bacias DRS1 e DRS2 e foi lavada pelas águas da chuva e descartadas irregularmente no meio ambiente, contém pentóxido de vanádio (elemento tóxico que em contato com o ser humano pode causar irritação nos olhos, pele, nariz e garganta, dificuldade respiratória e náuseas); pentóxido de fósforo (elemento corrosivo que pode causar lesões e queimaduras na pele); dióxido de titânio (que pode causar irritação respiratória, sonolência e vertigem e ter efeitos perigosos prolongados sobre a vida aquática) e cal (que irrita o nariz e a garganta e queima a pele e os olhos).

A Alunorte afirma que seus efluentes não contêm chumbo e que, de acordo com relatório do Ministério da Saúde, não é possível estabelecer correlação direta de contaminação da Alunorte ao meio ambiente. A empresa monitora a presença de metais pesados a cada seis meses e comunica os resultados à Secretaria de Meio Ambiente. A caracterização das cinzas geradas nas caldeiras da Alunorte é feita por ela mesma e, segundo a empresa, a concentração de metais pesados ficou abaixo dos limites nocivos.

Sobre a exigência de tratamento de água com metais pesados presentes, a Semas diz que “o órgão utiliza [como exigência] o que está preconizado na legislação ambiental brasileira”. Questionada a respeito da frequência com que fiscaliza o polo industrial de Barcarena, a assessoria de imprensa da secretaria disse apenas que “são realizadas frequentemente e de acordo com demandas”.

Atualmente, no tratamento das águas que são expelidas da Hydro Alunorte, a empresa afirma obedecer ao estipulado pela Resolução 430 do Conama, de 2011. O documento estabelece parâmetros para o descarte de resíduos que contenham metais como chumbo, cromo, mercúrio e zinco.

Para a professora Simone Pereira, o tratamento dado atualmente às águas em Barcarena não é adequado. “Você teria que construir uma estação de tratamento de água avançado, para tratar metais. Nem a Cosanpa [Companhia de Saneamento do Pará] tem isso. Não existe isso aqui [no Pará]”, argumenta. Ela acredita que a Semas não desempenha fiscalização adequada. “A Amazônia precisa de investimento, mas a indústria precisa entender que a Semas não precisa obrigar eles a fazer qualquer coisa. Eles têm advogados e técnicos, podem fazer por si sós. Por que não fazem?”

Fonte: Agência Pública

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