Eu quero é botar meu bloco na rua e depois de amanhã tanto faz

Não venha me falar em cinzas, nem em quartas-feiras nebulosas. Hoje eu só quero botar meu bloco na rua e depois de manhã tanto faz. Hoje eu só quero saber das incertezas das bebedeiras de carnaval, das camisinhas baratas, do cheiro de suor e das ressacas que só se curam com outras bebedeiras. Por hoje, e por mais este carnaval, eu só quero me preocupar com beijos triplos, perfumes baratos, frases mal entendidas, colombinas, arlequins, traições nos becos… Não me fala de nada sagrado… Eu só quero o que for pagão por hoje e por todo este carnaval.

Hoje é dia de botar o bloco na rua, dia de barrigas de fora, abraços desconcertados, vômitos escondidos, camisas perdidas, versos perdidos nas canções que só importam a batida própria dos pulos fora de compasso. A bebida nem precisa estar gelada tanto assim, o caso é se apaixonar perto do dia amanhecer e lamentar o acaso da chegada do sol… O bom da vida, uma vez por ano, é se perder um quanto que for e se ver sem um puto sequer pro táxi e voltar a pé entre abraços e reboques e salivas diferentes a cada passo.

O bom da vida são os blocos, as avenidas, toda a purpurina, toda a sorte de bocas e pés esmagados na rua. Por hoje, basta das amarguras, das inconstâncias de ser, da ‘sem gracice’ de se existir em um mundo real. A vida deveria ser um eterno carnaval e o ano político, formal, real, nem precisaria começar.
Não quero de saber de cinzas, nem que essa fantasia vai acabar… Prefiro ignorar que a magia do glitter acaba em poucos dias e que as gravatas são mais respeitadas que barrigas de fora e que remédios para dormir são mais usados que anticoncepcionais…

Ah, meu Deus… O ano começa quarta-feira e como eu vou viver depois disso? Como existir sem as paixões arrebatadoras de carnaval, sem o escárnio, sem os bloquinhos? Oh, Deus… obrigado pelos beijos triplos!
Ah, as bebedeiras, os capetas, as fantasias, os chapéus, o colorido das avenidas… Como o país fica um ano inteiro sem carnaval?
Eu não sei. E o ano já começa quarta-feira, mas eu não quero saber disso.
Hoje, e só mais esses dias, eu quero botar meu bloco na rua e depois de amanhã tanto faz.

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