Continuando o especial em comemoração aos 50 anos de Carajás, nesta 3° edição os leitores da coluna Mineração terão acesso a uma breve retrospectiva sobre a descoberta de Carajás, irão conhecer um pouco mais sobre a história, vida e entrevista exclusiva com o geólogo Breno Augusto dos Santos. Espero que apreciem!
O mapeamento da região Araguaia Xingu, onde foi descoberto Carajás, realizado pela United States Steel (Meridional), foi inicialmente feito pelos geólogos Erasto e Ritter sob liderança do geólogo Breno Santos que, em maio de 1967, instalaram base de apoio na ilha São Francisco do Xingu, localizada em Altamira-PA. Posteriormente, a partir de análises de fotos produzidas pelo Projeto Araguaia/DNPM, foi observado a distância da base até as clareiras e serras orientadas a leste, onde projetavam encontrar depósitos de manganês, sendo constatado a necessidade de mudança.
Em meados de julho do mesmo ano, houve a transferência da base de apoio para o Castanhal do Cinzento, localizado na confluência do rio homônimo e Itacaiúnas, onde os geólogos aproveitavam pousos para reabastecimento e recolhiam amostras de rochas da região. Na manhã do dia 31 de julho, juntamente com o piloto Aguiar, Breno seguiu em seu primeiro voo de helicóptero para reconhecimento do trajeto base São Francisco a nova base no Castanhal do Cinzento, onde pousaram para reabastecimento na clareira da Serra Arqueada.
“O que de mais importante ganhei com Carajás?… Mesmo reconhecendo que o estigma de Carajás acabou contribuindo para a minha carreira profissional, não tenho dúvidas em afirmar que foi a chance de ter vivido aquele momento, quando pude sonhar, antes que qualquer outro mortal, com a possibilidade de que a natureza nos tivesse sido tão generosa”, comenta Breno Santos no livro Pelas Pedras do Caminho Mineral, onde foi organizador e autor de algumas crônicas.
Acompanhe a entrevista exclusiva com o geólogo Breno Augusto dos Santos
O que representa o dia 31/07/1967 na sua vida Breno? Qual a primeira sensação/sentimento que você tem quando lembra dele? Foi um marco na minha vida. Mas Carajás foi para mim muito mais que esse momento. Poder ter participado, ou pelo menos acompanhado toda a sua história, foi a minha vida. Mas não resta dúvida que sempre sinto muita saudade ao relembrar a emoção daquele momento.
“Vê o que a meretriz vai dizer!.. Não vá deixar a gente passar vergonha…” Palavras do seu companheiro, amigo e também piloto Adão, fazendo alusão a sua apresentação no Congresso Brasileiro de Geologia em Agosto de 1968 sobre a descoberta de Carajás. Infelizmente durante a realização deste Adão faleceu. Breno, quem lê as crônicas integrantes do livro Pelas Pedras do Caminho Mineral da editora signus, cujo você foi organizador e autor, logo percebe o imenso carinho pelo piloto do Cessna 170 de prefixo PT-AOV. O que o piloto Adão representa para a descoberta de Carajás? Adão Coelho de Barros, ou simplesmente “Comandante Adão”, foi o primeiro grande amigo que perdi. Representou o nosso Dersu Uzala, da magnifica obra de Akira Kurosawa. Nos ensinou os segredos de região. Tudo que aprendi da geografia da região, em tempo onde não havia imagem de radar ou de satélite, devo aos sobrevoos feitos sob o seu comando.
Você acredita que a pista de N1 batizada pela Meridional com o nome de Comandante Adão Coelho de Barros, posteriormente desativada, poderia se tornar um memorial frente a sua importância para a implantação do projeto Carajás? Quais os outros pontos/lugares que você julga historicamente importantes para a cultura de Carajás e que devem ser preservados? Infelizmente a Vale não soube preservar o acampamento que lá havia. Não o pioneiro, que logo foi destruído, mas o que foi utilizado pela Amazônia Mineração, na pesquisa do ferro, e posteriormente pela DOCEGEO, na pesquisa do cobre e do ouro. Poderia ser um importante memorial para os visitantes conhecerem os tempos pioneiros. Mas ainda resistem os primeiros marcos topográficos de Carajás, e a barragem que foi construída para abastecimento de água do acampamento pioneiro. Essa barragem corresponde à primeira obra civil de Carajás, e consequentemente do Município de Parauapebas. Merecem ser preservados, pois não estão em área sobre minério de ferro. As três lagoas, que existem entre os corpos A e B da S11, já foram colocadas em área de preservação permanente pelo Instituto Chico Mendes.
Quando você aceitou retornar a Amazônia, mesmo com o medo de voar na bagagem, passou em sua cabeça, em algum momento, que alguma grande descoberta ou algum grande depósito poderia ser encontrado? Quais eram as suas expectativas quanto ao projeto Brazilian Exploration Program? No início foi apenas a busca de emprego, pois estava casado, e com uma filha de dois anos, sem sequer casa para morar em São Paulo. Estávamos divididos na casa dos pais. O planejamento inicial era trabalhar com Tolbert algum tempo e voltar para o Sul. Do ponto de vista geológico, sonhávamos encontrar algo como o manganês de Buritirama. Mas os sonhos tornaram-se maiores quando recebemos as fotografias aéreas do Projeto Araguaia, e verificamos a diversidade geomorfológica de região, com serras e platôs preservados. Mas depois do pouso na Serra Arqueada tudo mudou… Aconteceu Carajás, que virou uma cachaça…. Nunca mais consegui deixar de ter ligação com a região.
Com acontecimentos como a queda do helicóptero Hughes 300 PT-HBA em novembro de 1969 que levou a óbito o piloto Talma e o geólogo Roque próximo ao rio Araguari, ou a queda do helicóptero em dezembro de 69 nas margens do rio Maicuru, próximo a Monte Alegre, em que você e o comandante Aguiar sobreviveram, entre outros momentos de apreensão relatados nas crônicas Pelas Pedras da Amazônia, em quais momentos você teve medo de estar em Carajás ou pensou em desistir? O que o fez continuar na missão? Nessa época já havia perdido o medo de voar, e passei a considerar os acidentes como parte da rotina do trabalho. Mas passamos a exigir helicópteros com maior segurança. Depois disso, já na DOCEGEO, em 1971, sofri um acidente rodoviário grave, na Bahia, onde perdi o baço. E, em 1975, levando o Ministro Ueki, com toda comitiva do DNPM, em um helicóptero da FAB, para conhecer o local das futuras instalações da ALBRAS, caímos de novo, ao pousar, com destruição total da aeronave, mas sem danos às pessoas. Mesmo assim, continuo voando de helicóptero até hoje…
Como você vê o futuro de Carajás em relação a expectativa mineral? O conhecimento da Província Mineral de Carajás ainda está passando da juventude para a maturidade. Temos apenas 50 anos de trabalhos geológicos, com o uso de tecnologias mais avançadas apenas nos últimos 30 anos. Está no mesmo grau de conhecimento em que estavam as principais províncias minerais do Canadá e da Austrália, na década de 60, quando começaram a ser desenvolvidas as tecnologias geofísicas para a descoberta de depósitos não aflorantes. Carajás continua tendo um grande potencial para a descoberta de novos depósitos de cobre-ouro, particularmente não aflorantes.
Alguma recomendação ou recado para os profissionais que agora atuam e que virão atuar em Carajás? O primeiro recado é que tenho inveja de vocês. Gostaria de ter a sua idade e o seu entusiasmo. Para os que atuam na mineração, lembrem-se que as minas são os melhores afloramentos de Carajás. Muito de sua história e da sua evolução estrutural poderá ser nelas desvendado. Para os que atuam na exploração geológica, usem o conhecimento geológico como guia – leiam muito e estudem sempre –, mas fujam do estabelecimento de paradigmas. A Geologia sempre nos traz surpresas. E lembrem-se que só descobre jazida quem acredita que é possível…
Além disso, como em qualquer profissão, procurem também orientar o seu trabalho para objetivos socioeconômicos, defendendo um desenvolvimento harmônico para a região, com sustentabilidade econômica, social e ambiental.
Histórico profissional de Breno Santos
Breno Augusto dos Santos – Chefe do Projeto Carajás. Nascido em Olímpia, SP, em 1º de julho de 1940 e Graduado em Geologia pela Universidade de São Paulo, turma de 1963.
Trabalhou na Indústria e Comércio de Minérios Icomi S.A. na Serra do Navio, AP com pesquisa e exploração de manganês, exercendo atividade de Gerente do Departamento de Mineração entre setembro de 1964 e janeiro de 1967, depois como geólogo entre janeiro de 1964 e agosto de 1964.
Foi contratado por Gene E. Tolbert para trabalhar na Companhia Meridional de Mineração (United States Steel) em outubro de 1968, ocupando o cargo de Gerente Regional da Amazônia. Em maio de 1967 foi deslocado para ser Gerente do Projeto de Pesquisa Sudeste do Pará, onde posteriormente fora descoberto o depósito de Ferro de Carajás e de Manganês de Buritirama (PA). Em outubro de 1969, Breno saiu da United States Steel.
Entre junho e dezembro de 1971 foi Gerente Regional do Distrito Leste da Rio Doce Geologia E Mineração S.A. – DOCEGEO (CVRD). Em janeiro de 1972 até outubro de 1984 foi Gerente Regional do Distrito Amazônia, com sede em Belém, PA também na DOCEGEO. Nesse período foram realizadas as descobertas da Bauxita Metalúrgica de Almeirim (PA), Paragominas (PA) e Tiracambú (MA), da Bauxita do Tipo Refratário de Almeirim (PA) e Paragominas (PA), do Cobre e Ouro do Salobo (Carajás, PA), do Cobre do Igarapé Bahia (Carajás, PA), do Ouro de Andorinhas (PA), da Cassiterita do Antonio Vicente (PA) e do Fosfato do Maicuru (PA). Também foram realizados trabalhos de pesquisa no Manganês do Azul (Carajás, PA), Níquel do Vermelho (Carajás, PA), Ouro de Serra Pelada (Carajás, PA), Cobre do Pojuca (Carajás, PA), Cassiterita de Surucucús (RR) e Titânio de Maicuru (PA).
Entre outubro de 1984 e janeiro de 1993 foi Diretor Técnico, sendo que neste período foram descobertos as jazidas de Ouro do Igarapé Bahia (Carajás, PA) e a jazida de Caulim do Capim (PA). Foi Diretor-Presidente e Vice-Presidente do Conselho de Administração da DEOCEGEO entre janeiro de 1993 e março de 1994
Entre março de 1994 e janeiro de 1995 assumiu a Secretaria de Minas e Metalurgia do Ministério de Minas e Energia no Governo de Fernando Henrique Cardoso.
Entre julho de 1995 e agosto de 1997 compôs o cargo de Diretor-Presidente e Vice-Presidente do Conselho de Administração da DOCEGEO. Sendo descobertos os depósitos de Cobre e Ouro do Alemão (Carajás, PA).
Entre fevereiro de 1996 e abril de 2000 foi Membro do Conselho de Administração da CPRM e a partir de setembro de 2003 consultor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) / BNDES.
Por.
Camila Rodrigues