Condenação deixa Jatene fora das eleições de 2018

Mais do que a cassação do governador Simão Jatene e de sua inelegibilidade por 8 anos, a decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) – na última quinta-feira (30) – descortina o véu sobre um grande escândalo de compra de votos na eleição de 2014 com a utilização do Cheque Moradia, praticado pelo candidato do PSDB. Simão Jatene torrou R$ 113 milhões a mais do que os R$ 32 milhões previstos no orçamento daquele ano para, segundo denúncia do Ministério Público Federal (MPF), conseguir votos para a sua reeleição.

De acordo com o MPF, a maior parte desses recursos foi aplicada justamente nos meses de agosto, setembro e outubro de 2014, ou seja, em plena campanha eleitoral. Somente neste período, foram disponibilizados R$ 56,3 milhões para o programa, segundo dados fornecidos à Justiça Eleitoral pela própria Companhia de Habitação do Estado do Pará (COHAB) e que consta do processo de cassação do governador do Pará.

Os R$ 145 milhões – divulgados em nota oficial do governador, por meio da Agência Pará de Notícias – divergem da conta de R$ 131 milhões da juíza Luciana Daibes, voto que mudou o destino de Jatene e que, se confirmado após recurso, impedirá o governador de se candidatar a qualquer cargo nas eleições do ano que vem. Pelas contas da juíza, Jatene teria gasto quase R$ 100 milhões a mais do que o previsto. “Faltou clareza orçamentária nos relatórios enviados. Os gastos com Cheques Moradia ultrapassam 361% do valor previsto para 2014”, disse a juíza federal, ao proferir seu voto a favor da cassação de Jatene, por abuso do poder econômico.

FICHA SUJA

De acordo com a Justiça, nos 7 primeiros meses de 2014, foram concedidos 2.739 benefícios, o que dá uma média de 391 por mês. Apenas em agosto, esse número saltou para 1.282 e disparou para 2.526 em setembro. Ou seja, às vésperas das eleições, a distribuição dos Cheques Moradia por parte de Jatene registrou um alarmante aumento de 500% em relação aos primeiros meses de 2014.

A investigação do MPF começou com o então procurador regional eleitoral, Alan Mansur. Ele apurou que, nesse período, dezenas de centros comunitários foram utilizados para a efetivação da compra de votos por meio do Cheque Moradia. Para o atual procurador eleitoral, Bruno Valente, “foi uma decisão produtiva por parte do TRE, dando uma resposta justa ao fato ocorrido na campanha de 2014: a prática de poder político, em prol do governador que concorria à reeleição”.

O MPF também apurou que a concessão do Cheque Moradia aumentou de 3.483, no ano de 2012, para 7.883, em 2014, ano da eleição. O resultado de todas essas contas com relação ao benefício é um só: apesar do recurso que Jatene deve impetrar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para se manter no cargo de governador até o fim de 2018, ele agora é um político Ficha Suja diante da Justiça e também da população. Em seu voto, a juíza Luciana Daibes chama atenção para outra irregularidade gritante na utilização do Cheque Moradia.

OMISSÃO

Os R$ 113 milhões (pela nota do governador) ou RS 100 milhões (pelos cálculos da juíza) a mais gastos com o Cheque Moradia não foram previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2013 e muito menos constam do Balanço Geral do Estado em 2014. Ou seja, houve, por parte do governador Simão Jatene, omissão de declaração e de receita. Mais um problema grave e comprovado.

Isso significa dizer que esse dinheiro, permutado com empresários como renúncia fiscal do ICMS, transitou nas contas do Estado sem que fosse registrado oficialmente. Isso indica, no mínimo, que há uma profunda falha contábil. Numa comparação, apenas com o valor gasto a mais com o programa Cheque Moradia, em 2014, para comprar votos para Jatene – ou seja, R$ 113 milhões -, seria possível construir 30 escolas e 1.800 casas populares (veja box acima), que teriam muito mais utilidade ao povo do Pará. Mas as prioridades do governador são outras.

ESQUEMA

Parcela só foi liberada depois da eleição

Outra situação que causa “estranheza” – termo usado pelo governador em sua nota sobre a decisão da Justiça que o cassou – é que a liberação desses recursos dos Cheques Moradia foi feita em duas parcelas: uma antes do pleito de 2014 e outra só após o segundo turno da eleição. “Lembra a história do coronel que dava para o caboclo uma banda de sapato antes da eleição e outra só depois, após a vitória garantida”, ironiza o deputado estadual Iran Lima, líder do PMDB na Assembleia Legislativa. Iran chama a atenção de que ninguém é contra os programas de incentivo habitacional, como o Cheque Moradia. Entretanto, defende que eles sejam distribuídos de forma técnica. Nunca de maneira política e pessoal, como ocorreu com Simão Jatene na eleição de 2014. “É preciso que o Cheque Moradia tenha uma gestão transparente e que não permita que pessoas se beneficiem politicamente do seu uso”, diz.

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